Considerando, por um lado, a complexidade inerente às instalações de sistemas eletrônicos (automação, instrumentação, telecomunicações, etc.) e, por outro, a natureza sofisticada dos problemas de interferência eletromagnética e suas soluções, em que não é possível, a priori, o equacionamento de todas as variáveis envolvidas, é recomendado que o controle de interferência se faça por “fases de projeto” e que seja focado em diferentes “áreas da instalação”. Este procedimento permitirá o desenvolvimento dos trabalhos EMC com a profundidade necessária em cada situação.
Com a utilização crescente do espectro eletromagnético por diferentes sistemas de comunicações (telefones móveis, pagers, laptops com um misto de tecnologias de celular, Wi-Fi e Bluetooth, teclados e mouses sem fios, redes sem fios, walkie-talkie digital, Wi-Max/UWB, etc.), além das perturbações eletromagnéticas radiadas por diferentes sistemas eletroeletrônicos instalados nas imediações, torna-se imprescindível avaliar eventuais situações em potencial para o aparecimento de problemas de interferência devido a campos eletromagnéticos. Nesse sentido, é fortemente recomendado um levantamento preliminar da situação existente por meio da medição de campos EM no local em que o sistema eletrônico virá a ser instalado.
Este levantamento pode ser feito como uma medição exploratória do ambiente eletromagnético em 60 Hz (campos elétrico e magnético) e em alta frequência (utilizando-se medidores de faixa larga, por exemplo, cobrindo uma faixa desde dezenas de kHz até alguns GHz), de forma a identificar situações críticas tanto internas como externas ao prédio. O resultado dessas medições poderá indicar a necessidade de uma blindagem para alojar os equipamentos sensíveis, em função da intensidade dos campos presentes no ambiente e da imunidade dos equipamentos/sistemas a serem instalados. É muito importante que esta definição aconteça antes das obras civis, quando o custo para implantação de uma blindagem é significantemente reduzido. Existem diversos relatos de instalações “prontas” que tiveram que ser refeitas para a implantação de blindagem.
Eficiência de uma blindagem
Uma blindagem é, essencialmente, uma placa metálica colocada no espaço para controlar a propagação de campos eletromagnéticos de uma região para outra. Dessa maneira, uma blindagem pode ser utilizada tanto no sentido de conter uma fonte de perturbação eletromagnética, evitando a poluição do ambiente, como no sentido de proteger um circuito contra campos eletromagnéticos presentes no ambiente.
O efeito de uma blindagem na atenuação dos campos incidentes (shielding effectiveness) irá depender de diversos fatores, como a natureza do campo incidente, o ângulo de incidência, a frequência, o material da blindagem, etc., sendo possível a obtenção de valores superiores a 100 dB de atenuação em uma larga faixa do espectro (dezenas de GHz).
Este efeito de blindagem é definido como eficiência de uma Blindagem (EB) e é expresso por:
EB = 10 log (P1/P2) = 20 log (F1/F2) dB
Em que F1 e F2 são as intensidades do campo ao encontrar a superfície da blindagem (onda incidente) e ao sair da superfície (onda transmitida). A eficiência de uma blindagem é composta basicamente por dois mecanismos principais: perda por reflexão – R; e perda por absorção – A (o efeito de reflexões múltiplas dentro da parede da blindagem, que é bastante reduzido, não está considerado neste estudo).
Para estudarmos estes mecanismos, é necessário primeiro identificar a natureza do campo que queremos atenuar. Este campo depende da fonte que está gerando o campo e da distância à fonte em que é observado: uma fonte de alta tensão e baixa corrente irá gerar um campo predominantemente elétrico; uma fonte de baixa tensão e alta corrente irá gerar um campo predominantemente magnético.
Entretanto, a criação de um campo magnético não estático implica a geração de um campo elétrico, e vice-versa, e é desta forma que a energia eletromagnética é radiada pela fonte. Junto à fonte, a relação entre campo elétrico e magnético é complexa e, embora ambos existam, um deles será preponderante e as características do campo serão elétricas ou magnéticas. Esta região é referida como “campos próximos”.
Longe da fonte, a relação entre campo elétrico e magnético se torna constante, e é igual a 120π (377 ohms), sendo a relação E/H definida como Impedância de Onda (Zw). O campo nesta região distante, a partir de cerca de λ/2π da fonte considerando-se uma fonte pontual, é referido como “ondas planas”
Requisitos para projeto e instalação de uma blindagem
A construção das paredes de uma sala blindada é feita preferencialmente por solda ou por módulos, neste caso, permitindo maior facilidade para um eventual translado no futuro, por meio de chapa metálica ou de tela metálica, ambas atendendo perfeitamente aos requisitos de atenuação. As figuras a seguir exemplificam a construção de uma sala blindada modular de grandes proporções:
Um aspecto de maior relevância é o cuidado necessário para que não haja vazamentos pelas aberturas, como o espaço entre módulos, entrada de cabos, ventilação, portas, etc. O projeto executivo da blindagem deverá ser incorporado às obras civis e incluir a instalação de filtros (AC e sinal), continuidade elétrica nas portas e janelas, na entrada de ar condicionado, etc. É comum a utilização de portas especiais e filtros já disponibilizados no mercado de modo a se garantir o nível de atenuação pretendido.
Em algumas situações, a intensidade de campos eletromagnéticos no ambiente pode não justificar a implantação de uma sala blindada com melhor desempenho, nomeadamente para frequências mais altas. Entretanto, mesmo assim é recomendada a utilização de uma blindagem preventiva de menor custo, considerando situações de risco que possam se apresentar nas imediações, tais como a utilização de sistemas radiantes móveis (exemplo Walkie Talkie) ou a instalação de sistemas de rádio no futuro.
Uma tela metálica embutida na parede, completada com a malha de referência no piso e no teto (como recomendado para o sistema de aterramento), pode oferecer uma boa proteção a baixo custo contra campos eletromagnéticos. As figuras a seguir exemplificam a construção de uma blindagem de baixo custo para sala de equipamentos sensíveis:
Para uma tela metálica com abertura de malha de 25 mm, podemos prever uma atenuação da ordem de 30 dB para campos com freqüência de até cerca de 30 MHz. E nomeadamente quanto à possível influência dos campos gerados por descargas atmosféricas que ocorram nas imediações, que poderiam interferir com os equipamentos instalados, a atenuação proporcionada pela tela metálica, adicionada à atenuação do próprio prédio, favorece uma atenuação de cerca de 100 dB na faixa mais baixa do espectro, onde se situam as frequências mais significativas dos raios.
Finalizando, a necessidade da blindagem de salas para proteger equipamentos sensíveis contra campos eletromagnéticos presentes no ambiente, ou possibilidades futuras, é cada vez maior, e é sempre recomendado que seja feita uma medição do ruído eletromagnético no ambiente de instalação de um sistema eletrônico antes da conclusão das obras civis. Isso porque os custos necessários à adequação de uma instalação sobem exponencialmente quando os problemas são identificados posteriormente.
*Pablo Guimarães é engenheiro eletricista e engenheiro de segurança do trabalho, diretor de projetos da SLV Engenharia, e professor universitário da UFAM, ULBRA – Manaus e IFAM. Membro da Associação dos Engenheiros e Arquitetos do Amazonas –AEAA.
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